quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Ministério da Justiça lança consulta pública sobre marco civil para internet

Por Patricia Cornils

05 de outubro de 2009


O Ministério da Justiça vai lançar, no dia 29, um processo de consulta pública para a elaboração de um marco civil para a internet no Brasil. Esta é uma boa consequência do, a esta altura, quase finado projeto Azeredo. A reação à proposta relatada pelo senador Eduardo Azeredo, de criar uma lei penal para a internet, deixou evidente a preocupação da sociedade civil com o tema. Deixou clara, também, a inexistência de canais formais suficientes para garantir a participação da sociedade no debate, explica Guilherme Almeida, assessor da Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça. Este canal será aberto no processo de elaboração do marco civil, com a consulta pública por meio da internet.

Antes de se explicar como vai funcionar esta consulta, há uma boa questão a ser respondida: é necessário criar um marco civil para a internet ou basta interpretar os temas envolvidos (direito à expressão, direito ao anonimato, obrigação de guardar ou não as informações sobre a navegação) à luz da Consituição? Não é uma questão óbvia, porque, como argumenta Omar Kaminski, “não se pode querer novas leis toda vez que surgir uma nova tecnologia, já que sabemos que a internet ainda não teve nem a metade de seu potencial devassado”. Kaminski é advogado especializado em tecnologia e diretor de internet do Instituto Brasileiro de Direito da Informática.

Falta legislação específica

Para Ronaldo Lemos, coordenador do Centro de Tecnologia e Sociedade (CTS) da FGV Direito Rio, a solução ideal seria aplicar a Constituição, em vez de criar novas leis. Mas o ideal, neste caso, não é possível porque a Constituição, de acordo com ele, é abstrata demais no que tange às questões que envolvem a internet. “O texto constitucional assegura, por exemplo, a proteção do direito à privacidade. Mas não explicita como essa proteção deve ser feita”, explica. A consequência disso é que cada juiz decide as questões relacionadas a isso de forma diferente. “Esse é o pior dos mundos, porque não se sabe ao certo quais os deveres e responsabilidades na rede”, avalia Lemos. "Não há previsibilidade jurídica”, de acordo com Almeida, do Ministério da Justiça.

É o que acontece, na prática, com relação ao sigilo telefônico. Na falta de legislação sobre a guarda e a liberação de informações sobre as chamadas de um indivíduo, o Ministério Público, por exemplo, assina Termos de Ajustamento de Conduta com as telefônicas. Esses termos exigem a guarda das informações por três anos e procedimentos "expressos", sem controle do judiciário, de transferência dessas informações.

Garantia de direitos


Para Kaminski, se o caminho é, realmente, criar um marco regulatório cível, é melhor ter leis que garantam direitos do que restrinjam liberdades. “Mas a pergunta que não quer calar é a seguinte: será que já não é hora de começarmos a discutir a necessidade de uma nova (Ciber)Constituição Federal? Já é hora de um Direito 2.0 ou Justiça 2.0?”.

Legislar sobre internet suscita muitos debates. E a iniciativa do Ministério da Justiça reconhece isto na prática. O formato da consulta, em si, estimula a participação da sociedade e pretende reconhecer a relevância de suas contribuições. “É uma nova maneira de fazer e discutir leis, em que a participação popular vai definir tanto as premissas quanto o texto legal”, afirma Guilherme Almeida.

A consulta começará pela definição dos temas a serem tratados na proposta de lei. As referências para esta definição serão a Constituição, os Princípios para Governança da Internet Brasileira (do Comitê Gestor da Internet), e um texto-base do Ministério da Justiça. Este texto-base ficará em consulta pública por 45 dias, a partir do dia 29. Com base no resultado desta consulta, o Ministério da Justiça vai publicar um anteprojeto de lei, também no site, por mais 45 dias. Então consolida-se tudo e envia-se ao Congresso, ainda não se sabe se por meio de um parlamentar ou como projeto do Executivo. O CTS, de Ronaldo Lemos, é parceiro do ministério neste processo, tanto no desenvolvimento da ferramenta para a internet quanto no subsídio legal para os debates.

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